A história deve ser vista como uma ciência em constante construção. O atual estudo da história não se resume a meras questões factuais, isto é, a memorização de datas, episódios e nomes.
O historiador privilegia o emprego de uma metodologia científica, valorizando a análise, a interpretação e a postura crítica em relação aos episódios históricos. A periodização do tempo cronológico deve ser compreendida como um instrumento didático que tem por finalidade separar idades históricas que apresentam características peculiares que as distinguem.
Embora existam datas que ajudem a nortear as mudanças de idade, esses processos levam muitos anos e vários episódios estão envolvidos, gerando uma série de mudanças nas sociedades. Ou seja, tal divisão é meramente didática, sem a pretensão de ser perfeita ou completa.
Obviamente a história compreende um período muito longo e optamos por começar nossos estudos por um período muito importante para entendermos a sociedade atual, o feudalismo.
FEUDALISMO
A Economia
O Feudalismo pode ser visto como um sistema de produção a partir do século IX, definido após um longo processo de formação, reunindo principalmente elementos de origem germânica e de origem romana. Essa estrutura foi marcante na Europa Ocidental que foi sofrendo um processo de "ruralização" e desorganização das cidades após a queda do império romano (séc. V) e responsável pela consolidação de conceitos e valores que se estenderão por muitos anos, na chamada Idade Média.
A economia feudal possuía base agrária, ou seja, a agricultura era a atividade responsável por gerar a riqueza social naquele momento. A pecuária, a mineração, a produção artesanal e mesmo o comércio eram atividades que existiam de forma secundária.
Como a agricultura era a atividade mais importante, a terra era o meio de produção fundamental. Os proprietários rurais eram denominados Senhores Feudais, enquanto que os trabalhadores camponeses eram denominados servos e o feudo era a unidade produtiva básica.
Uma vez que os servos dependiam das terras dos senhores para viver, eram várias as formas de tributação que se estabeleciam entre eles. A talha era a mais comum. O servo era obrigado a entregar para o seu senhor metade da produção, fruto do seu trabalho e de sua família, ou seja, esse sistema se caracteriza pela exploração do trabalho servil.
Os impostos feudais, inclusive, ajudavam a preservar a estrutura estamental da sociedade europeia.
A Sociedade
A sociedade feudal era composta por três classes sociais: Clero, Nobreza e Campesinato (servos). A estrutura social praticamente não permitia mobilidade, sendo portanto que a condição de um indivíduo era determinada pelo nascimento, ou seja, quem nasce servo será sempre servo.
Cada grupo tinha sua função bem definida dentro da sociedade feudal. Na base, os servos representavam a grande massa de camponeses que produziam a riqueza social, ou seja, trabalhavam.
Os nobres eram os proprietários das terras e tinham uma função, enquanto cavalheiros, de defender a sociedade. No topo da pirâmide social está o clero que possuía grande importância, cumprindo um papel específico em termos de religião, de formação social, moral e ideológica. No entanto, esse papel do clero é definido pela hierarquia da Igreja, quer dizer, pelo Alto Clero, que por sua vez é formado por membros da nobreza feudal. Acabamos por considerar o clero e a nobreza como uma única classe social, a aristocracia.
A Política
No mundo feudal não existia uma estrutura de poder centralizada. Não existia a noção de Estado ou mesmo de nação. Portanto, consideramos o poder como localizado, ou seja, existente em cada feudo.
Apesar da autonomia na administração da justiça em cada feudo, existiam elementos limitadores do poder senhorial. A influência da Igreja Católica, única instituição centralizada, que ditava as normas de comportamento social na época, fazendo com que as leis obedecessem aos costumes e à "vontade de Deus". Dessa forma a vida quase não possuía variação de um feudo para outro.
Podemos, assim compreender que se trata de uma sociedade regida pelos costumes e tradições, uma vez que aquela organização foi feita por Deus não cabia ao homem criticá-la ou modificá-la. Ou seja, se trata de uma sociedade TEOCÊNTRICA.
Embora houvesse uma grande rigidez na estrutura social, isso não significa que não havia revoltas. Os servos protagonizaram muitas delas. O principal motivo para as contestações era a fome, pois independente da produção os senhores faziam questão de sua parte, mesmo que isso significasse a fome dos camponeses.
Embora existisse uma monarquia feudal, o rei não detinha controle sobre toda a sociedade, ou seja, ele não tinha súditos. O rei detinha apenas uma grande quantidade de vassalos que lhe garantia apoio militar e, em algumas circunstâncias, econômico.
O Renascimento Comercial e Urbano
As estruturas econômicas e sociais sofreram importante alteração a partir do reaparecimento do comércio. O aperfeiçoamento das ferramentas e das técnicas de plantio fez com que ocorresse um significativo crescimento da produção. Inicialmente, essa produção foi absorvida pela própria população do feudo. Mais tarde um excedente viria a promover um renascimento comercial e urbano na Europa devido a intensificação das trocas comerciais.
Com o crescimento do comércio observamos o surgimento das cidades comerciais, os burgos, e assim a BURGUESIA. É importante lembrar que esse grupo social que surgira enfrentaria ainda uma série de problemas não só com a Igreja Católica, que criticava o lucro e a usura, mas também a falta de uma padronização de pesos e medidas, um grande número de impostos e moedas. Ou seja, o comércio não era facilitado pelas estruturas vigentes.
Outro fator que acabou não só por fortalecer o comércio, mas também o processo de urbanização, foram as cruzadas. As cruzadas foram expedições militares-religiosas organizadas pela Igreja no concílio de Clermont pelo papa Urbano II em 1095 com o objetivo de expulsar os muçulmanos da Terra Santa.
Além dos interesses políticos e religiosos do papa, as cruzadas tiveram um importante papel na reabertura do mediterrâneo como rota comercial. O objetivo principal foi um fracasso, pois os muçulmanos, após violentos conflitos, conseguiram manter o controle sobre Jerusalém, mas com as últimas cruzadas algumas cidades italianas passam a monopolizar o lucrativo comércio com o Oriente, fator que propiciou mais tarde um grande renascimento cultural nessas regiões. Ou seja, graças a um processo de negociação, os italianos formavam-se os atravessadores das desejadas riquezas orientais.
A Crise
No século XIV, a Europa assistiu uma grave crise que demonstraria toda a fragilidade do sistema feudal e, consequentemente, sua deterioração. Devemos imaginar que todos os fatores que compõem a crise não eram novidade na época, guerras, fomes e pestes eram algo comum em uma sociedade guerreira e com precárias condições de higiene. Porém, esses fatores combinados levaram a uma grave quebra na curva demográfica europeia.
Começamos com uma grave crise agrícola provocada por problemas climáticos, que levaram em alguns casos a cenas de canibalismo. Nesse momento as guerras se tornam mais uma forma de se apropriar de alimentos e por esse motivo se tornam cada vez mais comuns. A última e mais conhecida das guerras feudais europeias foi a guerra dos cem anos (1337/1453) que envolveu as monarquias que futuramente se centralizariam nos Estados da Inglaterra e França.
É justamente nessa sociedade marcada pela fome e pela guerra que a peste negra não encontrara dificuldades para ceifar a vida de milhões de europeus. Além das repercussões políticas e econômicas da crise, percebemos que a forma de encarar a sociedade, a vida e até mesmo a religiosidade sofreram uma gradativa modificação.
A Formação dos Estados Modernos
A centralização política acabava se transformando em uma solução para os graves problemas enfrentados por todas as classes sociais. Para a nobreza, era importante um poder quepudesse garantir segurança. Justamente por isso, John Locke, um dos precursores do iluminismo, viria afirmar séculos depois que o Estado surgiu para garantir a vida e a propriedade privada.
O clero, além de possuir as mesmas preocupações da nobreza, também encontrara no Estado uma forma de manter sua hegemonia política e ideológica ao apoiar o Estado que surgira em torno da figura do rei.
Já a burguesia encontrou na própria centralização política o impulso as atividades comerciais. Aos poucos ia se transformando no principal parceiro econômico da monarquia e graças a isso conseguiu colher seus frutos. O estabelecimento de fronteiras, idioma, moeda nacionais e um imposto único ajudaram a fortalecer os burgueses.
O quadro estava pronto para que o processo de centralização fosse iniciado. De fato seria o Estado Nacional o principal agente patrocinador do ambicioso projeto de expansão marítima e comercial europeia que iria ampliar os horizontes geográficos da Europa ocidental e superar a crise europeia através de uma política mercantil de colonialismo e metalismo.
A crise e a consequente formação dos Estados fazem parte de um lento processo de transição da Idade Média para a Idade Moderna. Outros fatores serão muito importantes para que tal fenômeno seja concretizado.
O ANTIGO REGIME
introdução
Antigo Regime é o nome que damos ao conjunto de características que marcaram os Estados que se formaram na Idade Moderna. Embora seja importante ressaltar que nem todos os Estados tiveram o mesmo tipo de organização. No entanto, adotamos um modelo que se baseia no Estado francês.Para compreendermos melhor o período analisaremos a estrutura política, econômica e social. Assim, falaremos em absolutismo monárquico, mercantilismo e a sociedade estamental que marcaram a consolidação dos Estados Modernos europeus.
Podemos definir o absolutismo como um sistema político e administrativo que prevaleceu nos países da Europa, na época do Antigo Regime (séculos XV ao XVIII). No final da Idade Média (séculos XIV e XV), ocorreu uma forte centralização política nas mãos dos reis.
Tal centralização só foi possível graças a uma série de acordos que foram firmados entre as classes sociais da época.
A nobreza, atemorizada pelas diversas revoltas camponesas, percebia a necessidade de proteção. Encontrou na figura do soberano a garantia da vida e da propriedade privada. Dessa forma, abriu mão de seu poder político local em favor do rei, que a partir de então podia organizar seus órgãos onipresentes: exército permanente, polícia, burocracia, clero e magistratura.
Além disso, o monarca também estabeleceu a padronização de pesos e medidas, moeda nacional, tributos do Estado e língua nacional. Todas essas medidas acabaram ajudando uma burguesia que se via prejudicada com a descentralização medieval. Imagine a quantidade de moedas que os comerciantes tinham que carregar, além da infinidade de impostos que pagavam aos senhores feudais.
A burguesia se tornava a maior parceira econômica do rei.
Para a Igreja, a proteção do rei também foi algo muito interessante. Além de conseguir manter sua influência entre os súditos, a instituição conquistou alguns privilégios.
O mais importante agora é percebermos a importância da Igreja na legitimação do poder monárquico. Autores, membros do alto clero católico, como Bodin, Bossuet e Le Bret formularam a TEORIA DO DIREITO DIVINO DOS REIS, que consistia na ideia de que os monarcas foram designados por Deus. Eles seriam mensageiros do Senhor na terra e por isso sua vontade não podia ser contestada. Se levantar contra o rei era se levantar contra a vontade de Deus.
No entanto, havia também uma outra corrente que buscava legitimar o poder dos reis sem utilizar a religiosidade. Eram os leigos.
Dentre os mais citados está Nicolau Maquiavel, diplomata florentino, escreveu O Príncipe, um verdadeiro manual de como chegar e permanecer no poder. Para o pensador, o rei deve ser um homem de virtude, para ser capaz de perceber tudo que ocorre ao seu redor e tomar decisões que garantam a prosperidade e a ordem. Seus atos, inclusive, não precisavam estar de acordo com a moral cristã. Dessa forma, o príncipe pode mentir, roubar, matar, contanto que o seu objetivo fosse o fortalecimento de seu poder e do Estado.
É atribuída a ele a famosa frase: "os fins justificam os meios".
Outro importante pensador foi o inglês Thomas Hobbes. Em seu livro, O Leviatã, defendia a teoria de que os homens são naturalmente inaptos a viverem em sociedade. O homem seria corrupto e mau por natureza, o que garantiria um constante estado de guerra. Assim, "o homem é lobo do próprio homem", e por isso era necessário um Estado forte que pudesse garantir a paz e a prosperidade. Era a troca da liberdade pela segurança.
Ainda podemos citar o jurista holandês Hugo Grotius, considerado fundador do direito internacional, que defendia a necessidade do Estado ser forte para garantir sua independência frente aos demais Estados. Sua obra mais importante foi Do Direito da Paz e da Guerra.
A Sociedade
Devemos compreender o Estado absolutista na sua mais íntima relação com a estrutura da sociedade. Havia, basicamente, três camadas sociais: clero, nobreza e terceiro estado. Lembrando que as duas primeiras consistiam naquilo que chamamos de aristocracia. Era o que chamamos de uma sociedade estamental, onde a mobilidade vertical dentro da pirâmide social era algo extremamente difícil.
Comparando a Idade Média com a modernidade, percebemos que a sociedade não sofreu grandes alterações em sua estrutura. Isso se deve ao fato do Estado, na verdade, ter a função de garantir as relações de dominação do período anterior, fazendo com que a aristocracia mantivesse o predomínio sobre as demais classes.
Em troca do apoio político fornecido pela aristocracia o rei garantiu a manutençãode uma posição privilegiada para o grupo dentro do Estado que se formava. Gozavam de privilégios, como por exemplo, o direito de portar armas, direito de exploração dos camponeses, e principalmente a isenção fiscal. Ou seja, a aristocracia não pagava impostos, sobrecarregando as demais camadas sociais que compunham o terceiro estado: burguesia, artesãos e camponeses.
No entanto, o conflito entre as classes sociais foi condição fundamental do poder absoluto. O próprio rei instigou o conflito, procurando sobrepor-se a ele e dele tirar proveito. Protegeu a alta burguesia, deu-lhe monopólios comerciais e industriais, arrendou-lhe impostos, garantiu-lhe ascensão social, apoiando-a contra clero e nobreza. Reciprocamente, concedeu privilégios ao alto clero e domesticou a nobreza, atraindo-a a seus palácios por meio de cargos e pensões.
O poder real, em suma, descansava sobre o conflito generalizado que tendia a equilibrar as forças sociais, especialmente o conflito entre as duas classes mais poderosas, nobreza e burguesia.
Mercantilismo
O Mercantilismo é entendido como um conjunto de práticas, adotadas pelo Estado absolutista na época moderna, com o objetivo de obter e preservar riqueza. A concepção predominante parte da premissa de que "a riqueza da nação é determinada pela quantidade de ouro e prata que ela possui". Os metais preciosos permitiriam ao governo comprar armas, contratar soldados, construir navios, pagar funcionários e custear as guerras. A essa ideologia damos o nome de Metalismo.
Ao mesmo tempo, os governantes consideravam que a riqueza que existia no mundo era fixa, não poderia ser aumentada, portanto, para um país enriquecer outro deveria empobrecer. Essa concepção foi responsável pelo acirramento das disputas entre as nações.
O agente econômico do Mercantilismo era o próprio Estado que praticava um intervencionismo sobre a economia. As relações econômicas eram uma prerrogativa real e a participação da iniciativa privada era permitida somente com a autorização do Estado que cobrava tributos pela concessão.
O metalismo não foi a única atividade mercantilista. Até porque a simples aquisição do metal não garantia a acumulação. A Espanha era, no século XVI, o país mais rico da Europa em consequência do ouro e da prata oriundos de suas colônias da América e também pelas guerras que os metais puderam sustentar. No entanto, o atraso do comércio das manufaturas e da agricultura espanholas, entretanto, obrigava a Espanha a importar de outros países europeus a quase totalidade das mercadorias necessárias ao seu consumo. Como essas importações eram pagas em ouro e prata, os metais preciosos que chegavam à Espanha eram, em seguida, desviados para o resto da Europa.
Para garantir a superioridade econômica outras atividades foram necessárias. Desenvolver o comércio, aumentando as exportações, e restringir as importações através de protecionismo alfandegário foram formas de garantir uma balança comercial favorável e, consequentemente, o acúmulo de metais.
O Mercantilismo adquiriu características próprias nos diversos Estados Modernos europeus. Os holandeses estimularam a criação de Companhias de Comércio, Casas Bancárias e, principalmente, a organização de uma poderosa marinha mercante que praticava o frete marítimo entre outras nações europeias. Os ingleses investiram bastante no Corso, ou seja, a pirataria em nome do Estado. Além de garantir também um amplo desenvolvimento de suas manufaturas.
Já os franceses desenvolveram o Colbertismo. Nome oriundo do idealizador da política econômica francesa Jean-Baptiste Colbert.
Colbert tornou-se controlador geral das Finanças em 1665, quando iniciou um grande investimento nas manufaturas de luxo, tendo como público alvo a aristocracia europeia.
Acreditava que o desenvolvimento do comércio traria também o crescimento de outros setores ligados a essa atividade econômica, como infraestrutura, por exemplo.
Não podemos esquecer outras duas práticas mercantilistas que estão intimamente ligadas a história da América: o tráfico negreiro, que transferiu uma imensa quantidade de africanos para trabalhar de forma escrava no novo mundo, e o Colonialismo.
Prof. Sérgio Torres
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