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sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Mecânica Quântica com exercícios propostos e resolvidos - @fisicaseculo21

Em 2000 completamos os cem anos da constante de Planck, um marco histórico na Física.   Em 1900 a física quântica estava dando seus primeiros passos.

Seria muita pretensão de nossa parte apresentar cem anos de pesquisas neste pequeno capítulo. Pretendemos na verdade passar para você uma noção das principais ideias dessa nova área.

Nesse tempo todo temos muita teoria e, como consequência, muita tecnologia, que juntas mudaram a cara do mundo. É bem provável que no conforto de sua casa você utilize inúmeros aparelhos que funcionam com base em ideias desenvolvidas pela física quântica. Por exemplo, quando você ouve música usando um aparelho de CD, a magia toda está num feixe de luz laser que lê os dados registrados na superfície refletora do compact disk. Toda a tecnologia laser foi desenvolvida a partir da física moderna. Quando você usa uma filmadora portátil de vídeo, que é praticamente uma estação de TV de mão, a captura da luz visível também é feita por dispositivos fotoelétricos, tecnologia desenvolvida a partir da física moderna. Circuitos eletrônicos internos de vários aparelhos digitais e de computadores também funcionam com base em propriedades quânticas da matéria.

Depois da relatividade, já vista no capítulo anterior, agora é a vez da física quântica. Vamos mergulhar no mundo das escalas atómicas e tentar entender melhor como é que ele se comporta.

A emissão de radiação térmica por corpos quentes

Até o século 19 a comunidade científica acreditou que o calor fosse um fluido capaz de passar de um corpo para outro, por meio dos fenômenos da condução ou da convecção estudados em termofísica. Mas era difícil explicar como o calor do Sol podia chegar à Terra, atravessando um espaço vazio* sem aceitar que deveria haver uma terceira forma de transmissão de calor: a irradiação, que ocorre através de ondas eletromagnéticas, quase sempre invisíveis para o ser humano, como o infravermelho, por exemplo.

Você mesmo, em sua cozinha, já deve ter feito alguns "experimentos" cotidianos de aquecimento de corpos e pôde verificar que, quanto mais quentes, mais calor eles emitem. Quem já ficou próximo a uma churrasqueira sabe muito bem que o carvão em brasa irradia calor que pode ser sentido pela pele mesmo a distância. Nesse caso o carvão também está emitindo ondas na faixa do visível, pois fica incandescente, o que pode ser facilmente observado.

*    Na verdade, nessa época o espaço não era vazio mas supostamente preenchido com o éter, conforme vimos no capítulo anterior.

O equilíbrio térmico

Quando você coloca algum alimento dentro de um forno e liga a fonte térmica (chama a gás, por exemplo), o calor é absorvido pelo sistema (forno mais alimento) e a temperatura obviamente sobe. A temperatura sobe sem parar ou chega num valor-limite?

Da prática você sabe que haverá um limite. Antes de ligar o forno, tudo está na temperatura ambiente. Quando o forno é ligado, o alimento e as paredes do forno recebem calor da fonte térmica. Quanto mais aquecido o sistema, mais radiação térmica ele emite.

Você não vê necessariamente as ondas de calor emitidas pelo forno ou pelo alimento, mas pode detectá-las ou senti-las de alguma forma. Aliás, em dias muito quentes de verão, ficar próximo de um forno ligado é bastante desconfortável, não?



É importante ressaltar que há dois fluxos de calor: um que é absorvido pelo sistema e outro que é emitido. Podemos considerar que o fluxo de calor absorvido é constante. Mas o fluxo de calor emitido aumenta com a temperatura. Enquanto o fluxo absorvido for maior que o cedido, a temperatura do sistema tende a crescer. O crescimento da temperatura faz com que o fluxo de radiação emitida aumente, até que se iguale ao fluxo absorvido. Quando isso acontece, dizemos que o sistema atingiu o equilíbrio térmico, ou seja, a temperatura fica estável num certo valor-limite.

Um dos pioneiros a estudar o problema da emissão térmica foi o físico alemão Gustav Robert Kirchhoff (1824-1887), que se interessava pela emissão térmica do Sol, além da emissão de outros corpos quentes.

Kirchhoff descobriu uma propriedade importante: se um corpo absorve X% de radiação incidente, então ele também emite os mesmos X% da radiação produzida. Conclusão:

O poder de absorção e o poder de emissão são diretamente proporcionais.

Kirchhoff então imaginou um corpo ideal e que absorvesse 100% da radiação incidente. Esse corpo, num primeiro momento, deveria ser negro para ter tal poder de absorção. Mas, pela proporcionalidade entre o poder de absorção e o de emissão, esse corpo ideal deveria emitir também 100% da radiação produzida. Assim foi que Kirchhoff introduziu a ideia de corpo negro ideal:

Corpo negro ideal é todo corpo capaz de absorver toda a radiação nele incidente, para cada frequência, bem como emitir toda a radiação térmica que produz.

Assim:

Todo corpo negro ideal é igualmente um absorvedor e um emissor ideal de radiação.


Como conseguir um corpo negro ideal na prática?

Kirchhoff sugeriu que, para estudar a emissão térmica de um corpo negro ideal, pode-se usar uma cavidade com um pequeno orifício por onde a radiação externa entre e depois fique presa, pois sofre reflexões e absorções internas. Observe que é muito improvável que a radiação escape de volta, uma vez que não atravessa às paredes e dificilmente conseguirá sair pelo minúsculo orifício. É mais ou menos como uma armadilha que aprisiona a radiação! É um belo "truque" prático para absorver 100% da radiação, não?



Na prática, uma fonte qualquer de calor pode ser instalada diretamente dentro da cavidade. Isso já garante que a radiação a ser absorvida se encontre dentro da cavidade, o que melhora ainda mais a aproximação de um corpo negro ideal.

Embora o termo "negro" tenha sido sugerido inicialmente, essa cavidade não precisa ser negra necessariamente. Um corpo negro pode ter qualquer cor, desde que se encaixe na definição de absorvedor e emissor ideal!

Em 1859 Kirchhoff descobriu um fato interessante:

A emissão de radiação é a mesma para vários corpos em equilíbrio térmico, independente do material constituinte, da massa, do volume, forma etc., pois depende apenas da temperatura do corpo.

A constatação de Kirchhoff é surpreendente! Dela deduzimos, por exemplo, que, se a radiação emitida por corpos aquecidos é a mesma, então a frequência emitida é a mesma. Isso equivale a dizer que a cor que vemos é a mesma para todos os corpos.

Se você já foi a uma fundição ou viu uma foto ou filme de um forno de alta temperatura, percebeu que tudo fica da mesma cor, um tom amarelo-alaranjado característico. Isso ocorre porque estão na mesma temperatura, em equilíbrio térmico.

Como era explicada a emissão térmica de um corpo?

A vibração dos átomos era considerada a origem dessa radiação térmica.

Os átomos presentes num corpo têm uma agitação térmica, ou seja, ficam vibrando o tempo todo, ao redor de uma posição de equilíbrio, como osciladores que aceleram e desaceleram. Assim eles emitem radiação eletromagnética, como se fossem antenas. Essa radiação emanada pelos átomos acelerados também é refletida e reabsorvida nas paredes internas.

O sistema tende a estabelecer o equilíbrio entre a radiação absorvida e a emitida pelos átomos. A partir daí pode-se medir um pouco de radiação que escapa pelo orifício, chamada de radiação de corpo negro.


Os átomos nas paredes da cavidade oscilam em movimento harmónico simples, em torno de uma posição de equilíbrio, emitindo radiação eletromagnética como se fossem antenas transmissoras.

A curva espectral da radiação de corpo negro e o deslocamento de Wien

A radiação térmica pode ser separada em faixas de frequências (ou comprimentos de onda). Assim podemos desenhar uma curva espectral, ou seja, um gráfico com a intensidade da radiação para cada valor de frequência (ou comprimento de onda).

Em 1894, o físico alemão Wilhelm Wien (1864-1928) fez uma demonstração teórica extremamente elegante na qual prova que, se soubermos a forma da curva espectral da radiação térmica para uma dada temperatura, podemos encontrar as curvas para qualquer outra temperatura.

No gráfico, a intensidade I é a potência (em W) por unidade de área (em m2) para cada frequência f (em Hz).



Segundo Wien:

a) o máximo do gráfico depende da temperatura da cavidade;

b) as curvas obtidas têm sempre a mesma forma, independente do material que constitui a cavidade.

Isso é conhecido como deslocamento de Wien e o nome é bastante sugestivo, pois para cada valor de temperatura a curva toda sofre um deslocamento, como visto na figura.

Wien também verificou que a temperatura e a frequência relativa ao pico da curva variam de forma proporcional:

fpico / T = C

em que a constante C vale 1,03.10^11   Hz/K.

A expressão acima é chamada de lei do deslocamento de Wien.

O espectro da luz solar e a visão humana

Fazendo a luz do Sol passar por um prisma e medindo a intensidade da energia para as diversas frequências, obtemos uma curva espectral. O Sol, como toda estrela, é um bom irradiador de energia. Podemos aproximá-lo de um corpo negro.

O pico da curva corresponde a uma radiação de frequência aproximadamente de 5,6.10^14 Hz, ou seja, o comprimento de onda no pico será:



Esse é o valor do comprimento de onda mais ou menos no centro do espectro visível. Tudo indica que o ser humano, durante sua evolução biológica, sofreu um processo de adaptação da visão à radiação solar. Vale a pena lembrar que o mecanismo da visão é extremamente importante para um indivíduo na busca do alimento, na detecção de predadores e na escolha de parceiros, dentre outros.

Pela curva espectral da radiação solar podemos ainda estimar a temperatura superficial do Sol, uma vez que a radiação provém da camada mais externa.

Usando a lei do deslocamento de Wien:

No interior do Sol, onde ocorrem as reações nucleares de fusão, a temperatura é brutalmente superior.











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